Diálogo II

sábado, 1 de novembro de 2008


"Os homens partiam cedo para o campo ou para o mar. Mas o campo era deserto e o mar sem peixe.
Aquele que partiu para o campo levantou a enxada, erguendo os braços ao alto, até um ponto culminante, em que todos os músculos se concentraram e a enxada ficou pronta a cair, ganhando força, ligeiramente inclinada para trás, caiu finalmente, num único impulso, e esse movimento foi repetido, desde o cantar do galo ao pôr do Sol, até o homem não sentir mais o seu corpo.
Enquanto cavava ia falando com a morte. Eu lavrarei a terra e semearei o campo, disse o homem ao nascer do Sol. E eu mandarei a geada, e ela crestará a sementeira, disse a morte. E a semente germinará e a seara ondulará ao vento, disse o homem ao meio-dia. E o Sol a queimará pela raiz, disse a morte. E nascerão espigas e darão pão, disse o homem ao pôr do Sol. E as larvas comerão as espigas, disse a morte, da mesma maneira que comerão o teu corpo. E a morte tirou a enxada das mãos do homem e cavou ela própria uma cova e o homem deitou-se nela e as larvas vieram e comeram o seu corpo."

"Paisagem com mulher e mar ao fundo" - Teolinda Gersão.

Trecho forte, mas muito lindo!



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