Nudez

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

De repente, ela se via nua diante do médico e diante do corpo falecido sobre a mesa. O médico, que fingia naturalidade, explicava os acontecimentos daquele dia tenso que resultara no cadáver que ali estava. E ele era sensível, o médico. Explicava com suavidade e delicadeza, para não sufocar a mulher que ali estava, parada, com o olhar disperso. Na tentativa desesperada de cobrir a sua nudez, a mulher apertava os lábios com força e respirava fundo, sentindo cada partícula de ar seguindo pelo seu corpo, ainda se lembrando da respiração forçada que ouvira durante o longo caminho até o hospital. Mas não adiantava. Uma veia saltava-lhe no rosto, os olhos vermelhos pareciam formar uma barreira que continha um choro desesperado, prestes a explodir, e era como se se despisse completamente, com toda a sua dor e seu ressentimento prontos a irromper. Mas ela já estava nua, descoberta e vulnerável diante do médico suave. O que lhe restava, então, além de tentar esboçar um sorriso, uma última tentativa de retomar as vestimentas jogadas pelo chão, e cumprimentar o médico suave que ali discursava sem parar, na esperança de acalmá-la e devolver-lhe a sensatez, a razão, e o mínimo de orgulho.

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