O enredo de "Memórias de minhas putas tristes", de Gabriel García Márquez, além da linda história sobre um homem que chega aos 90 anos com a saúde de um homem de 40, é uma narrativa moderna e repleta de uma sensibilidade que não se nota logo em princípio, quando nos deparamos com o título.
O velho escritor de crônicas nos apresenta um pouco de suas "putas tristes": velhas prostitutas e cafetinas solitárias e mal amadas, que preencheram a também solitária vida do escritor de crônicas, sendo as suas únicas companhias. Elas buscaram, ao longo de suas vidas, o amor, o reconhecimento no outro, a "alma gêmea", e envelheceram nesta busca que é a de todo o ser humano. E algumas pessoas encontram, seja no companheirismo de um cliente assíduo, como a velha Rosa Cabarcas, a grande cafetina, ou a menina virgem, que encontrou o amor no velho de noventa anos cuja única intenção também era amá-la, sem qualquer outra exigência.
As putas tristes e o cronista de García Márquez refletem os amores atuais, instantâneos e imediatistas, remédios rápidos para a solidão diária de nossa modernidade triste, e que, diferentemente do velho cronista que nos conta o seu aniversário de 90 anos, quase nunca chega aos cem!
"Começava a adormecer na madrugada quando
senti como um rumor de multidões no mar e
um pânico das árvores que me atravessaram
o coração. Então fui até o banheiro e escrevi
no espelho: Delgadina da minha vida,
chegaram as brisas do natal."
(Memórias de minhas putas tristes, pág. 82).