O texto de hoje será
um pouco diferente das paisagens que estou acostumada a postar aqui no blog:
dessa vez não tem romantismo, não tem miséria, não tem drogados. Graças à
Fernanda, moça que escolhi, no ônibus quase vazio, para me sentar ao seu lado,
o texto de hoje é um desabafo. Mas não meu, o texto é um desabafo da Fernanda.
Fernanda me olha e solta um suspiro.
Obviamente não entendo o seu significado. Ela olha pela janela e vê uma
geladeira rosa sobre uma caminhonete. “Você viu? Era uma geladeira rosa. Eu
queria ter uma geladeira rosa”, diz Fernanda. Eu não vi, respondo à moça. Era o
pontapé inicial para a conversa.
Depois de nos cansarmos de falar
sobre geladeiras, fogões e carros rosa, Fernanda me diz, de repente: “eu tenho
esclerose múltipla”. Eu, em minha ignorância, tinha uma leve lembrança do que
seria esclerose múltipla: uma doença grave, muito grave. Ponto. Fico olhando
para Fernanda pensando que ela talvez devesse estar internada, ou algo do tipo,
se tivesse mesmo esclerose múltipla. Ela me surpreende quando começa a contar
sua história. Fernanda teve uma crise aos 18 anos, ficou imóvel, sem memória,
sem poder comer, sem falar, por vários dias, até que descobriram qual era a
causa de sua crise, a esclerose múltipla. Luta contra a doença tomando injeções
“dia sim dia não”, que são doloridas, para evitar as crises e “sumir as manchas
no meu cérebro”, conta a moça.
Em sua história não aparece a
palavra mãe. Fernanda me fala do pai e das tias que a criaram. Parece ter tido
uma infância sofrida. Na crise, foi levada às pressas para um hospital público
em Osasco.
Agora, aos 22 anos, a doença “controlada”,
Fernanda ainda toma injeções “dia sim dia não”, mas está cansada desta luta.
Fernanda também trabalha no Mc Donalds (o que realmente a transforma em uma
guerreira), e desabafa comigo que sua fé é que diminuiu as “manchas no cérebro”
que apareciam na ressonância magnética e a forte dor de cabeça que a maltratava.
Sempre que termina de relatar um
acontecimento, Fernanda suspira, com a cabeça levantada, talvez para segurar o
choro. Mas Fernanda é muito forte, não chora. Assim como é forte para injetar o
remédio nela mesma. Assim como é forte a prece que ela faz, todas as noites,
para que as manchas no cérebro sumam na próxima ressonância. E eu acredito em
Fernanda.
Ao descer do ônibus, cumprimento
Fernanda segurando em seus braços e dizendo “na próxima ressonância, você
estará muito melhor, pode acreditar”. E Fernanda acredita em mim.
Graças a sua força, simpatia e
simplicidade, Fernanda ganhou nesta tarde mais uma voz para rogar a Deus por
sua recuperação, a minha. E neste desabafo de Fernanda, se houver pelo menos
mais uma voz na mesma oração, Fernanda ficará ainda mais forte e não haverá
mais manchas, nem dores de cabeça, e nem injeções.
Um comentário:
Vou rezar por ela também! A vida nos surpreende!
Beijos, Patrícia.
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