Ainda sobre meninas...

domingo, 29 de novembro de 2009

A menina de 19 anos que casou com seu primeiro amor está sentada ao meu lado, no banco do ônibus. Minhas tatuagens lhe chamam a atenção, "quero desenhar o meu bebê", diz a moça. Mas a menina, com todos o seu amor, não pôde ter filhos, e transferiu todo o seu carinho para o filho de outrem.

Sua irmã já esteve presa, "agora aprendeu", e a realidade da menina fica exposta entre os passageiros em pé e entre mim, sentada ao seu lado.

Ela sorri, mesmo depois de mais um dia de luta, aquela luta diária, a luta pela sobrevivência.

A menina, então, se despede e salta do ônibus. E eu, metida nesse meu individualismo, às vezes mesquinha, às vezes indiferente, nem perguntei qual o seu nome.

Sobre contos

quarta-feira, 25 de novembro de 2009


Olho para os personagens do conto de Tchekhóv como se fôssemos nós: enredo envolvente, clímax extasiante, final incerto.

Se eu tivesse o direito de escrever, em tinta vermelha, o final do nosso conto se transformaria num recomeço repleto de planos e passeios por todas as ruas tranquilas que ainda não visitamos.

Enquanto isso, do lado de cá, fico a imaginar como escreverias, em teu caderno, o final para esta mesma história.

Sobre seres humanos

domingo, 22 de novembro de 2009

"(...) E mesmo assim - acredite! - em seus resquícios o ser humano era belo. Todos os membros retorcidos num gestual insano, fazendo caretas, mas belo. Sem o rubor dos lábios nem o brilho dos olhos, sem o tímido sorriso, sem sua voz doce ou perigosa, sem o hábil jogo de dedos e sem o andar ereto, mesmo assim o ser humano era belo."



Trecho de "A Ratazana", de Günter Grass. Esta é a fala da Ratazana apocalíptica que narra o extermínio da raça humana sobre a terra, por culpa, é claro, dos próprios humanos.

Eterno Retorno

domingo, 15 de novembro de 2009


"E se um dia ou uma noite um demônio se esgueirasse em tua mais solitária solidão e te dissesse: "Esta vida, assim como tu vives agora e como a viveste, terás de vivê-la ainda uma vez e ainda inúmeras vezes: e não haverá nela nada de novo, cada dor e cada prazer e cada pensamento e suspiro e tudo o que há de indivisivelmente pequeno e de grande em tua vida há de te retornar, e tudo na mesma ordem e sequência - e do mesmo modo esta aranha e este luar entre as árvores, e do mesmo modo este instante e eu próprio. A eterna ampulheta da existência será sempre virada outra vez - e tu com ela, poeirinha da poeira!". Não te lançarias ao chão e rangerias os dentes e amaldiçoarias o demônio que te falasses assim? Ou viveste alguma vez um instante descomunal, em que lhe responderías: "Tu és um deus e nunca ouvi nada mais divino!" Se esse pensamento adquirisse poder sobre ti, assim como tu és, ele te transformaria e talvez te triturasse: a pergunta diante de tudo e de cada coisa: "Quero isto ainda uma vez e inúmeras vezes?" pesaria como o mais pesado dos pesos sobre o teu agir! Ou, então, como terias de ficar de bem contigo e mesmo com a vida, para não desejar nada mais do que essa última, eterna confirmação e chancela?"

(Trecho de "A Gaia Ciência" - Friedrich Nietzsche)


Estaria o ser humano fadado ao eterno ciclo de repetições das ações diárias e suas conseqüências sobre o destino da humanidade? Todo sofrimento, toda alegria, toda dor que assolam a existência desde o princípio dos tempos até hoje, fariam parte do Eterno Retorno descrito por Nietzsche?


O filósofo alemão Friedrich Nietzsche, polêmico por suas obras de títulos fortes como “O Anticristo”, ou “Além do Bem e do Mal” e por afirmações como “Deus está morto”, não foi o primeiro a refletir sobre a possível circularidade na existência humana. Platão, expressão máxima da filosofia grega, também já havia teorizado sobre o eterno retorno do mesmo, como um tipo de trajeto que o mundo físico percorre, e que, chegando a um determinado fim, passa a repetir-se eternamente. Na religião, o ser humano está fadado ao sansara, conceito budista o qual diz que estamos presos na roda das encarnações, e, desta forma, nossas almas reencarnarão e passarão novamente por todas as fases da nova vida, sofrendo mais uma vez todas as ações e consequências já antes vividas por gerações anteriores.


Nietzsche, no trecho citado acima, faz-nos questionar sobre o nosso modo de agir: “Quero isto ainda uma vez e inúmeras vezes?”, e pensar sobre as consequências na futura repetição. Será que, se agirmos corretamente e escolhermos determinados caminhos ao invés de outros, conseguiremos alguma variação de ações dentro do ciclo de repetições?


Sem dúvida, estas reflexões não se enquadrariam no pensamento e filosofia nietzschianos, considerando-se que o filósofo alemão possui como grande característica de sua obra o ceticismo e a falta de crença religiosa, porém, expandindo-se um pouco os horizontes, passando pela religião e pelos grandes pensadores gregos, por que não pensar que todas estas teorias se completam e fazem parte da eterna tentativa de solucionar o maior mistério de todos os tempos: a vida?





Leia mais sobre Nietzsche no Campo de Orquídeas

Bilhetinho para uma menina especial

quinta-feira, 12 de novembro de 2009


Não voltei mais à escola da menina dos versos, e sinto como se a tivesse abandonado...

Mas, sabe o que acontece, menina? É essa minha inquietude, essa ânsia de não sei o quê, misturada com uma vontade de tudo, que me fez abandonar o tédio, a obrigação, e viver...

Desculpe, menina, mas as noites, de agora em diante, serão minhas, só minhas.

Vontade de cantar...

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Linda música que descobri há poucos dias, porque eu não gosto do cantor, e porque eu não gosto do estilo... mas a música é linda!!!!



Clique na imagem!


Sobre meninas

sábado, 7 de novembro de 2009


A menina sentada na última fileira, com ares de travessa, é poetisa, e ela não tem vergonha disto.

Eu ainda me lembro dos meus versos de 15 anos que mantive, por tantos anos, escondidos no caderno capa dura, entre dúzias de livros, com medo de que algum dia fossem descobertos.

A menina, que está sentada na última fileira, não tem medo de publicar seus sentimentos. Ela é linda, e tem leves traços infantis, marcas de mulher ainda em formação. Ela se aproxima de mim lentamente, um pouco tímida, "Eu escrevo poemas", sussura baixinho.

"Posso ler?", pergunto à menina, que me entrega o caderninho amarelo, composto por uma letra bonita e muito bem cuidado.

"São muito bons, você deve continuar, continue sempre...", confesso à menina.

"Eu quero ser escritora", diz a menina, voltando, satisfeita, para o seu lugar, no fim da sala repleta de sonhos inquietos.
 
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